
O caboclo Bernardo jogou-se ao mar tentando levar
até o cruzador um cabo de espia. Luta contra as ondas, mas é jogado na praia.
Tenta ainda uma vez, e volta novamente, depois de uma luta terrível contra a
força das águas. Sua mãe, uma cabocla velha, pede-lhe para não insistir, mas ele
se lança ainda ao mar. Parece que da primeira vez teria levado o cabo,
excessivamente pesado, amarrado à cintura; de outra o amarrara à sua rede, com
tresmalhos de cortiça, ou a uma linha de pescar, que puxaria pelos dentes. O
fato é que luta em vão contra as águas açoitadas pelo vento; e regressa à praia
exausto. Os náufragos olham tudo aquilo com angústia. O caboclo Bernardo se
desvencilha dos braços dos que querem detê-lo e entra no mar pela quarta vez.
Nada com desespero em direção ao navio, mas não avança; pouco depois é jogado na
areia. Levanta-se – e volta. Só então, pela quinta vez, consegue chegar ao navio
com o cabo salvador. Forma-se um cabo de vai e vem, e os marinheiros saltam de
bordo agarrados a ele para chegar em terra. Muitos o conseguem. Outros,
enfraquecidos pelas horas de tormenta, não resistem e morrem. O caboclo Bernardo
joga então ao mar a única embarcação que resta, uma pequena chalana. Pede dois
marinheiros para ajudá-lo, e ligando essa chalana ao cabo leva os náufragos para
a terra, de dois a dois. De vez em quando a chalana vira; o caboclo Bernardo,
com seus dois companheiros, cai na água para desvirar a embarcação e segurar os
náufragos. Trabalham assim durante horas, até que o mar despedaça de uma vez a
chalana. Havia ainda 13 homens a bordo, que afinal se salvaram em uma jangada
improvisada, agarrando-se ao cabo. Graças ao brutal heroísmo do caboclo Bernardo
foram salvos 128 homens em um total de 142.
Estas notas eu as extraio do livro do Sr.
Norbertino Bahiense O Caboclo Bernardo e o Naufrágio do Imperial
Marinheiro, que acaba de ser publicado em Vitória; e o que não está no
livro me contou o velho Meireles, numa destas manhãs de chuva e sudoeste, ali
mesmo na Barra, onde tudo assistiu. Deixo para outra crônica o resto da história
desse caboclo Bernardo, tão rude e tão bom.
Fevereiro, 1949
Fonte: Crônicas do Espírito Santo, 1984Autor: Rubem BragaCompilação: Walter de Aguiar Filho, janeiro/2012Obs.: Este livro foi doado à Casa da Memória de Vila Velha em abril de 1985 por Jonas Reis
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