A
área na qual se situava a Toca, na rua Luciano das Neves, não chegava a dispor
de dez casas. Quem lá morava era considerado um aventureiro e pessoa de espírito
desbravador. A energia elétrica mal chegava à metade da sua extensão e a
iluminação pública não existia. Esses novos moradores tinham, geralmente,
parentes que residiam no centro de Vila Velha, nas imediações das linhas de
bonde.
Na
cidade, pouco populosa, quase todos se conheciam, e quando não, sabiam pelo
menos da existência uns dos outros. Para citar apenas um exemplo, lembramos um
cidadão morador da Toca chamado Francisco Ferreira Coelho. O terreno em que ele
construiu sua casa era considerado grande, tanto de frente quanto de fundos. Lá
ele possuía algumas vaquinhas de leite, um pequeno aviário e alguns animais
domésticos, um pomar e uma horta. O Chico Coelho, como era popularmente
conhecido, tinha as suas raízes mais fortes fincadas no centro da cidade.
Destacava-se dentre seus parentes o Desembargador Ferreira Coelho, morador de
confortável casarão no alinhamento — como quase todas as casas da época — da rua
Luciano das Neves.
Bem
relacionado na cidade, Chico Coelho recebia muitas visitas em seus domínios,
tanto de parentes e amigos como de pessoas desconhecidas. Dessas idas e vindas à
casa do Chico Coelho surgiu o nome "Toca". Bastou que, num determinado dia
perdido no tempo, alguém que se dirigia à sua casa para lhe fazer a costumeira
visita se encontrasse com outra pessoa e estabelecesse com ela um diálogo mais
ou menos assim:
—
E aí, há alguns dias que não o vejo. Tudo bem com você?
—
Tudo bem, obrigado. E você, como está?
—
Tudo em ordem. Só quero saber para onde você vai com tanta pressa.
—
Estou indo à Toca, — respondeu o outro, mais enigmático do que
preciso.
—
Toca?
—
Sim, à Toca.
—
Que lugar é este? Moro há tantos anos aqui e ainda não o conheço e nem sei onde
fica.
O
outro, gostando do rumo da prosa, continuou mais misterioso ainda e saiu-se com
esta:
—
Por acaso você sabe em que lugar se recolhe o coelho?
—
Claro que sei. Vive e se esconde numa toca.
—
Então estamos entendidos, amigo. Vou à casa do nosso amigo comum, o Chico
Coelho. Se ele é Coelho, mora na Toca.
Os
dois amigos, trocado o diálogo, deram boas risadas. A conversa tomou conta da
cidade, correndo de boca em boca, e o nome Toca pegou.
A
princípio era empregado para identificar a propriedade de Chico Coelho, para
mais tarde servir de referência àquela área da rua Luciano das Neves. Depois a
Toca passou a ser freqüentada por outras pessoas que não se dirigiam apenas à
casa de Chico Coelho, que foi totalmente esquecido, mormente nos dias
atuais.
Depois
de tanto tempo com essa denominação inquestionável e sem batismo formal, o nome
Toca caiu quase em completo esquecimento, sendo a localidade apenas conhecida
como rua Luciano das Neves com os seus respectivos números, um local ou uma rua
como outra qualquer.
O
mesmo povo que generosamente homenageou um dos seus primeiros moradores, mutável
através das gerações, preferiu, por certo, adotar o nome da rua com os seus
números e casas comerciais a lembrar que ali existiu um bairro de maior
abrangência identificado como Toca.
Fonte: Ecos de Vila
Velha,2001
Autor: José Anchieta de SetúbalCompilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2012
Autor: José Anchieta de SetúbalCompilação: Walter de Aguiar Filho, abril/2012
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