- Distante seiscentas e quatorze milhas de
Vitória, seis mil metros de extensão por dois mil de largura, de formação
vulcânica, creio pelo levantamento do fundo domar, situada aos 20 graus e 30
minutos da latitude sul e os 20 graus e 22 minutos da longitude W Greenwich,
está a Ilha de Trindade. 1/6 de sua superfície é suscetível a cultura,
prestando-se o resto do terreno para criação de cabras.
É formada de uma só montanha com cerca de 600
metros de altura, tendo muitas enseadas e muitos morros. O solo acidentado e
formado por argila e rocha calcária, rica em anidrido e potássio, o que explica
o aparecimento fácil de fogo. A terra que está superficialmente sobra as pedras
e que com pequeno golpe de enxada descobriria o terreno inútil e incapaz de
semear-se nele coisa alguma, e roçada a vegetação que a protegia, a marga
calcária ficando exposta a umidade da noite, aos raios do sol inflama-se. Tudo
muito semelhante à queima da cal virgem pela água.
Não há grandes árvores na ilha, os picos da
Trindade e Desejado são cobertos por arbustos de três a quatro metros. Não há
moscas e nem mosquitos. O que mais abunda na ilha são os caranguejos amarelos
que vivem em buracos cavados no barro e se alimentam de capim. Saem para pastar
quando o sol começa a declinar e recolhem-se pela manhã.
O clima da ilha parece bom. A temperatura é
suportável nas praias e muito agradável nas montanhas. As noites são frescas e a
água é excelente – são alguns trechos que recolhemos do relatório fornecido as
autoridades navais por Cantuária Guimarães que integrava a guarnição do “Carlos
Gomes”, em 1914 quando a Marinha procedeu vários estudos da ilha. E que
transcrevemos para que os leitores possam ter uma idéia do que seja a Ilha de
Trindade, antes de entrarmos na parte que nos interessa.
Como se deduz pelos trechos do relatório de
Cantuária Guimarães e por outros levantamentos feitos posteriormente pela
Marinha, a Ilha de Trindade representa um ponto perdido no oceano Atlântico de
grande importância. E tamanha é essa importância que até bem pouco tempo os
ingleses pretendiam tomar para si a ilhota capixaba. Agora, os americanos
pretendiam e ainda pretendem, mediante acordos, a concessão da ilha para ali
instalar uma Estação de Radar, um Posto de Investigações Científicas e a pista
dos Tele-guiados, a exemplo do que ocorre com a Ilha de Fernando de Noronha.
Entretanto, a de Fernando Noronha teve
preferência inicial que pode explicar facilmente: é numa ilha habitada, com
campo de aviação, porto de atracação de navios, além de outras facilidades que
permitem o seu aproveitamento em mais pronto tempo do que a nossa, que não
possui absolutamente nada, a não ser restos de acampamentos.
A guerra moderna exige uma série de cuidados que
não havia anteriormente, é lógico. A Marinha e a Força Aérea Americana, vem
procurando por todos os meios aperfeiçoar foguetes que podem ser lançados de
submarino, outros de aviões em pleno vôo ou da terra, e que virão, no futuro a
substituir os próprios aviões.
Várias tipos de foguetes foram Idealizados: o
“Bomarc” (engenho supersônico propulsionado durante grande parte de sua
tragetória por dois motores de reação do tipo Ram-Jet. Este foi praticamente
colocado de lado pelo perigo que representava explodindo dentro do centro de
formação); os mais em moda são: “Matador” (atinge 800 km); “Régulos” (2400
km);”Navaho” “Wiking” e o “ Snark” que ultrapassam em muito os anteriores. Um
novo tipo, por outro lado, está sendo aperfeiçoado. Trata-se do “Atlas” que pode
ser considerado como ponto final em matéria de foguetes tele-guiados e onde a
imaginação não vê mais nada.
De qualquer forma, entretanto, ainda não se
atingiu uma situação em que todos os problemas técnicos estejam, resolvidos. E a
maior prova disso são as “fugidas” que tem ocorrido nos últimos tempos, não só
com os foguetes de Marinha como da Força Aérea dos Estados Unidos o que vem a
representar um grande perigo, já que um foguete fugindo do controle da estação,
não tem destino certo podendo tanto cais em Vitória (colocando a base na ilha de
Trindade) como em outra qualquer parte do mundo. Até hoje, nenhum desses
foguetes atingiu cidade alguma. Eles têm caído sobre desertos, no mar, em
florestas, como foi o caso do “Snark” que caiu na floresta a0mazônica.
Uma pista de Tele-guiados, a respectiva Estação
de radar colocada na costa capixaba seria, sem dívida, uma grande defesa contra
qualquer ataque ao Brasil, embora também representasse perigo, pelas razões
explicadas.
Entretanto, isso não acontecerá tão breve, já que
a Ilha da Trindade não está em condições, o que não acontece com a Fernando
Noronha, de receber uma base para os Tele-guiados.
Mas, de qualquer forma, a nossa pequena ilha
representará, num possível conflito mundial, um ponto perdido no Oceano
Atlântico de valia inestimável para a defesa do território e das águas
brasileiras, pela sua colocação geográfica. Os entendimentos entre os governos
brasileiros a americanos ainda não chegaram ao seu final, e enquanto isso não
acontece, a Trindade continua sendo a misteriosa ilha onde a terra pega fogo e
os caranguejos pastam mansamente ao declinar do sol.
Fonte: Revista Vida Capichaba Nº 750,
janeiro de 1957Autor: Adam Emil
Nenhum comentário:
Postar um comentário